Sofia, a menina que lutou sem parar
Sofia, a menina que lutou sem parar
Estar no Allianz Parque nunca mais será a mesma coisa para José Leonel e Camila. Pisar dentro do estádio do Palmeiras – ou até mesmo nos arredores – traz uma forte lembrança de Sofia, filha única do casal que faleceu no dia 22 de junho, aos 10 anos.
Em outubro de 2023, a garota foi diagnosticada com Glioma intrínseco difuso (DIPG), um tumor raro e agressivo, localizado no cérebro ou no topo da coluna e normalmente encontrado em crianças entre cinco a nove anos. Foram pouco mais de nove meses de luta contra a doença, que ainda é pouco conhecida no mundo e, por isso, não tem um tratamento mais eficaz.
“Eu estava saindo de Ribeirão Preto para vir a uma reunião em São Paulo e, mais tarde, para o jogo do Palmeiras, contra o Boca Juniors, pela Libertadores. A médica, então, nos ligou informando que havia saído o resultado dos exames. Aí eu acabei abortando a minha viagem. Nesse dia eu estava sozinho. Ela foi diagnosticada com DIPG”, contou Leonel.
“Infelizmente há pouca pesquisa e é muito agressivo. Não tem cura. Logo começamos a procurar médicos e ver qual tratamento seria possível. Nos indicaram o melhor médico do mundo na área. Ele disse que ela teria oito a dez meses. Já era uma vida intensa e ficou ainda mais”, ampliou.
Para ajudar no tratamento, Sofia usou como inspiração o seu maior amor: o Palmeiras. A camisa do clube era como se fosse a segunda pele da menina, que tinha uma coleção de mais de 30 blusas do Alviverde.
“Usamos muito o Palmeiras no tratamento, a música também. Palmeiras é o time da virada. A gente dizia que Sofia era a menina da virada. A gente acreditou até o final em um milagre. Mas o milagre foi outro”
“A Sofia conseguiu transformar muita gente, com a coragem e garra que ela teve. Ela nunca reclamou de nada. Ela lutou pela vida até o último momento”, completou Leonel.
Sofia foi ao Allianz Parque pela primeira vez com apenas dois anos e não se abalou com o alto barulho feito pela torcida. Pelo contrário. No colo do pai, balançava os braços para ajudar a incentivar os jogadores. Desde pequena, aprendeu que o hino nacional brasileiro era nada mais nada menos que a repetição de duas palavras: “Meu Palmeiras”.
E o jogo era grande. Tratava-se de um clássico contra o Flamengo. E a família foi pé quente. Vitória de 4 a 2 sobre os cariocas. Na época, Leonel e Camila viviam situação financeira delicada, mas o advogado ganhou três ingressos de um amigo. A partir de então, ir aos jogos do Verdão passou a ser obrigação.
“Eu comprei uma bandeira e anotei os gols. Eu costumava fazer isso para ela em jogos importantes. Comprávamos a bandeira na porta do estádio e anotávamos o resultado”, lembrou Leonel.
Com uma melhor condição econômica, Sofia passou a ir em quase todos os jogos com os pais e entrou em campo com os jogadores algumas vezes. A primeira foi quando ainda tinha quatro anos. Na ocasião, ele esteve ao lado de Thiago Martins, zagueiro que atualmente está no New York City, dos Estados Unidos. Ela também teve a oportunidade de dar as mãos para atletas como Fernando Prass, Felipe Melo, Jailson, Weverton e, mais recentemente, Endrick.
Leonel e Camila seguram camisa de Sofia assinada por Abel Ferreira
(Foto: Rodrigo Matuck/Gazeta Press)
Foto: Rodrigo Matuck/Gazeta Press
A joia alviverde, que foi vendida ao Real Madrid, aliás, foi o último jogador a levar Sofia para o gramado do Allianz Parque. A despedida da garota do estádio palmeirense foi no dia 7 de abril, quando o Palmeiras venceu o Santos por 2 a 0 e se consagrou campeão paulista de 2024.
Leonel quase nem conseguiu assistir ao jogo. Com a saúde já debilitada, Sofia acompanhou a partida escorada nos braços do pai, que a colocou de pé na cadeira K2, no Gol Sul, setor 126. O advogado deixou o estádio com dores no braço, mas qualquer incômodo ficou para trás ao ver o brilho nos olhos de sua filha celebrando aquele que seria o seu último título nas arquibancadas.
“Ela já estava com dificuldade para andar. O tumor começou a afetar tudo, visão, mobilidade…Naquela semana ela recebeu uma atenção muito especial. Ela era muito fã do Endrick e gostava muito do Aníbal Moreno”, relembrou o pai.
“Foi muito especial, muito marcante. A gente sabia que poderia ter sido a última vez. E foi…”
Apesar de nova, Sofia entendia de futebol e costumava assistir programas esportivos para fazer comentários com Leonel, que se impressionava com a noção que ela tinha.
“Às vezes os pais não conseguem passar essa paixão para o filho, mas ela criou um amor ainda maior que o nosso. Era uma paixão incrível pelo Palmeiras”, comentou Camila.